O feminicídio é uma das formas mais brutais de violência de gênero e deixa marcas que ultrapassam a vítima direta.
Quando uma mulher é assassinada, muitas vezes por quem dizia amá-la, não é apenas uma vida que se perde — são também crianças e adolescentes que ficam sem mãe, sem amparo e, em muitos casos, sem sustento.
Pensando nessas vítimas indiretas, o Decreto nº 12.636/2025, publicado em 29 de setembro de 2025, trouxe uma conquista histórica: a pensão especial para filhos e dependentes de vítimas de feminicídio.
Mais do que um benefício financeiro, trata-se de uma medida de reparação social, um instrumento que reconhece a responsabilidade do Estado em proteger quem mais sofre com os impactos dessa violência.
Neste artigo, você vai entender quem tem direito, como solicitar, quais são as regras e restrições, e como o governo vai acompanhar e garantir que esse auxílio chegue a quem realmente precisa.
O que diz o Decreto nº 12.636/2025
O Decreto nº 12.636/2025, publicado no Diário Oficial da União, regulamenta a pensão especial instituída pela Lei nº 14.717/2023, destinada a filhos e dependentes de mulheres vítimas de feminicídio.
O texto detalha os critérios de elegibilidade, os procedimentos de solicitação, as regras de pagamento e define quem fará a gestão e o monitoramento do benefício.
Essa medida representa um avanço na proteção social e na reparação de danos causados pela violência doméstica e familiar, reconhecendo que o impacto do feminicídio não termina no crime, mas se estende aos filhos e dependentes que ficam.
Quem tem direito à pensão especial?
A pensão especial garante um salário mínimo mensal para crianças e adolescentes com menos de 18 anos na data do óbito da mãe, desde que a renda familiar per capita seja igual ou inferior a 1/4 do salário mínimo.
O direito é estendido também a:
- Filhos e dependentes de mulheres transgênero vítimas de feminicídio;
- Crianças e adolescentes sob tutela do Estado, com o valor depositado em conta específica e fiscalizada.
Critério de renda:
Para calcular, some todos os rendimentos brutos dos moradores (salários, benefícios, pensões, autônomos, aluguéis) e divida pelo número de pessoas da família.
Exemplo: se o salário mínimo é de R$ 1.412,00, ¼ equivale a R$ 353,00 por pessoa.
Essa regra garante que o benefício chegue a quem realmente vive em vulnerabilidade social.
Como solicitar a pensão especial?
O INSS é o órgão responsável por receber os pedidos e conceder o benefício.
O requerimento deve ser feito pelo representante legal do menor (pai, mãe sobrevivente, tutor, guardião ou instituição responsável) pelos canais do INSS — portal Meu INSS, telefone 135 ou atendimento presencial agendado.
Documentos necessários:
- Documento de identificação do representante legal (RG, CNH);
- Documento de identificação ou certidão de nascimento da criança/adolescente;
- Certidão de óbito da mulher vítima de feminicídio;
- Provas do crime, como boletim de ocorrência, inquérito policial, laudo do IML, denúncia ou sentença judicial;
- Comprovante de renda familiar, para verificar o critério socioeconômico;
- Comprovante de residência atualizado;
- Comprovante de inscrição no CPF e no CadÚnico (que deve estar atualizado a cada 24 meses).
O INSS poderá solicitar documentos adicionais para confirmar a condição de dependência e o enquadramento nos critérios legais.
Regras de pagamento e restrições
Valor: um salário mínimo mensal (sem 13º salário e sem descontos).
Não acumulável com outros benefícios previdenciários — o representante poderá escolher o mais vantajoso.
Divisão do valor: se houver mais de um dependente, o valor será dividido igualmente.
Proibição de representação: o autor, coautor ou partícipe do crime não pode representar os beneficiários perante o INSS.
Cessação: o benefício termina quando:
- o beneficiário completa 18 anos (salvo incapacidade permanente);
- ocorre o falecimento do beneficiário;
- a renda familiar ultrapassa o limite permitido;
- uma decisão judicial desqualifica o crime como feminicídio.
Quem faz o monitoramento e a gestão?
A execução e a fiscalização do benefício são compartilhadas entre:
- Ministério da Previdência Social, responsável pela operacionalização e pagamento via INSS;
- Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social (MDS), que fará o acompanhamento dos beneficiários, oferecendo inclusão em programas de proteção, acompanhamento psicossocial e acesso a serviços públicos.
Essa integração entre Previdência e Assistência Social é fundamental para que o benefício não seja apenas financeiro, mas um instrumento de reconstrução de vidas.
Importância social da medida
O Decreto nº 12.636/2025 consolida o entendimento de que o feminicídio é um crime que destrói estruturas familiares inteiras.
Ao assegurar uma pensão especial, o Estado:
- Reconhece a dupla vitimização sofrida por filhos e dependentes;
- Promove justiça social e reparação;
- Garante condições mínimas de subsistência e desenvolvimento às crianças e adolescentes órfãos;
- Contribui para romper ciclos de pobreza e vulnerabilidade causados pela violência de gênero.
Perguntas frequentes
1. Quem pode solicitar a pensão?
O representante legal do menor (pai sobrevivente, tutor, guardião ou instituição pública).
2. Quanto tempo leva para sair a pensão especial?
Depende da análise do INSS e da entrega completa da documentação, mas o benefício é devido a partir da data do requerimento.
3. O benefício tem 13º salário?
Não. O valor é mensal, fixo e sem abono anual.
4. É preciso processo criminal concluído para solicitar?
Não necessariamente. É possível apresentar inquérito, boletim de ocorrência ou denúncia enquanto o processo judicial ainda estiver em andamento.
5. O autor do crime pode receber o benefício em nome dos filhos?
De forma alguma. O decreto proíbe que o agressor represente ou administre os recursos.
Um passo importante para a justiça e a dignidade
A pensão especial para filhos e dependentes de vítimas de feminicídio é mais do que um auxílio financeiro — é um ato de justiça, empatia e reconstrução social.
Ela reconhece o impacto profundo da violência de gênero e dá às crianças e adolescentes órfãos uma chance de recomeçar com dignidade.
Para que o direito seja efetivado, é fundamental buscar orientação jurídica e social.
Advogados e assistentes sociais têm papel essencial em garantir que nenhum órfão fique sem o amparo que a lei assegura.
O feminicídio fere a sociedade como um todo — e cada ação como esta, que ampara suas vítimas indiretas, é um passo firme rumo a um Brasil mais justo, humano e igualitário.